O papel estratégico do Brasil na segurança alimentar global

Por Eduardo Bastos
CEO do Instituto Equilíbrio

Em meio a um cenário de crescentes pressões climáticas, o Brasil se encontra no epicentro de uma equação global: como continuar sendo um dos maiores celeiros do mundo diante de mudanças ambientais que desafiam a segurança alimentar e a estabilidade econômica?

Um estudo recente publicado na revista Environmental Research Letters por Fiorini et al. (2024), com base em mais de 1.800 artigos, revela que 67% dos impactos já observados das mudanças climáticas na agricultura brasileira são negativos. As culturas de mandioca, arroz, trigo e cacau estão entre as mais afetadas, com perdas de produtividade que, em alguns casos, ultrapassam 30% em anos de seca extrema. Mesmo cultivos resilientes como soja, milho e cana enfrentam efeitos mistos, variando conforme o clima e a região.

Esse risco é real e já se materializa em dados concretos. No Espírito Santo, a produção de café — símbolo da identidade agrícola nacional — registrou quedas de 30% entre 2016 e 2021, resultado de ondas de calor extremo associadas ao fenômeno El Niño, segundo o Incaper. No Paraná, análises do Deral indicam reduções de 15% nas safras de milho em dois anos consecutivos, reflexo de estiagens que comprimiram as janelas de plantio.

Esses exemplos se somam a uma realidade mais ampla. Segundo Fiorini et al. (2024), há um desequilíbrio regional significativo na produção científica sobre o tema, com pouca atenção dedicada ao Norte e ao Centro-Oeste, justamente regiões-chave para o agronegócio. A agricultura familiar, responsável por boa parte dos alimentos básicos consumidos no país, também é pouco representada nos estudos, o que limita a capacidade de formulação de políticas públicas eficazes.

Além disso, mudanças nos padrões de chuvas e temperatura favorecem o avanço de pragas e doenças antes controladas por estações definidas. A proliferação da Helicoverpa armigera, por exemplo, devastou lavouras de algodão em invernos mais quentes, conforme dados da Embrapa. A variabilidade e a intensidade dos eventos extremos também desafiam sistemas produtivos antes considerados estáveis.

Diante de riscos tão complexos, a inovação climática aplicada à agricultura torna-se um pilar estratégico para o Brasil. Soluções como irrigação de precisão, sistemas integrados lavoura-pecuária-floresta e plantio direto ganham relevância. Políticas públicas como o Plano ABC+ apontam caminhos promissores para a transição agroambiental, e certificações sustentáveis abrem portas para mercados exigentes em rastreabilidade e responsabilidade socioambiental.

O Instituto Equilíbrio acredita que o Brasil pode e deve liderar essa transformação. Unir competitividade agrícola e inovação tecnológica é o único caminho para garantir prosperidade de longo prazo. Isso exige não apenas investimento em pesquisa e desenvolvimento, mas também pontes de diálogo entre produtores, cientistas e formuladores de políticas.

O futuro da agricultura brasileira dependerá da nossa capacidade coletiva de agir com base em evidências, planejar com visão estratégica e implementar soluções que equilibrem produtividade e proteção dos nossos recursos naturais. O clima está mudando. A agricultura também precisa mudar — e o Brasil tem todas as condições de liderar essa mudança.

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